Eu corri, corri, corri. Estava com medo de tudo e de todos. E tem uma coisa que eu gostaria tanto que você soubesse... desculpe, mas não poderia contar tal fato.
Ainda estava a ler a mensagem no celular enquanto esperava o ônibus na frente do Armênia. Estava frio, ameaçava chover fortemente naquela tarde de outono - tarde não, já devia estar anoitecendo. E eu ainda sentia um tom de urgência, mesmo já estando dentro daquele ônibus com aquelas janelas tão embaçadas com o ar quente de respirações. Resolvi ligar... chamou, chamou, chamou e nada. Ainda sim, mantive uma calma que não era do meu feitio.
Mais uma vez tentei - chamou, chamou e desligou. Não fiz um gesto que não fosse inútil. Mais uma mensagem - "aonde você está?". Até quis responder, mas me contive. Outra: "Poderia vir ao Adamastor? Tenho algo que preciso te mostrar".
Suspirei e respondi que estava perto de lá. Mandou-me um smile e pediu para que quando estivesse perto, que ligasse avisando-o. Após ter lido, mirei a paisagem, mas tive que limpar o suor com a manga do moletom. A paisagem estava verde, muito verde. O céu, acinzentado. E então, voltei meu olhos para o celular, cujo papel de parede era a minha foto preferida dele - usando um terno, tão altivo - altivez que sempre soube que nunca tive. E detestava, algumas vezes. Estremeci.
Cheguei em casa, e já estava chovendo. Já tinha tomado o maior banho durante o (maldito!) translado. Tentei ligar novamente, mas não consegui. Então, tendo apenas trocado os sapatos e enxugado os cabelos, fui ao Adamastor.
Entendia o gosto dele por marcar encontros em teatro - já que tudo entre nós havia começado por tal paixão mútua por palcos; mas sentia que estava num tom melancólico que me fazia acreditar que não seria boa coisa. E fui. Novamente num ponto, dos inúmeros espalhados pela cidade e que eu esquecia de observar.
Celular. Mais uma ligação, que desta vez, eu atendi - "porque não me ligou? já está perto?"; seguido de um "estou atrasada? já estou chegando aí.". E pediu que fosse o mais rápido possível. "Em cinco minutos" - e desliguei.
E tudo se tornou repetitivo: os vultos, os prédios, os mesmos carros, a mesma sensação de melancolia me atacava. Eu quis correr, mas não chegaria no tempo prometido. E então, não me conformei. E descendo do ônibus, corri pelas portas do teatro, que pareciam trancadas. Gritei. Gritei. E gritei de novo. Ele não apareceu.
E como de súbito, uma pessoa de aparência anciã surge - "ele está lá dentro, no palco...". Agradeci com um abraço e fui.
Um corpo lá estava, caído. A luz azul a iluminá-lo. Tive receio de me aproximar, mas em vão. Me atirei em direção a ele. Ele chorava, chorava tanto que nenhuma palavra se fez necessária.
Sentei-me. Perto dele. Ele se deitou no meu colo. As lágrimas não caíram mais somente dos olhos dele, mas dos meus também. Pedidos de desculpas que não precisavam foram ditos, sentimentos que não eram explicitados, ficaram explícitos... Aquele azul da luz que ainda nos iluminava, naquee silêncio que tornava aquilo ainda mais melancólico - mas ele, parou com o choro e pousou a mão sobre o meu rosto molhado. Agradeceu-me sem palavras. Eu apenas consentia, quando ele me beijou.
Após tal momento, a luz já não era mais azulada, era branca. BRANCA. Um novo começo, talvez...
[Entao tentei ver se havia alguém na sala de técnica.
Não havia ninguém.]